Resenha: A Revolução dos Bichos – George Orwell
Uma fábula sobre poder, manipulação e a eterna fragilidade da liberdade
Resenha: A Revolução dos Bichos – George Orwell: Ler A Revolução dos Bichos, de George Orwell, é como encarar um espelho desconfortável que reflete muito mais do que uma história sobre animais em uma fazenda. É uma metáfora corajosa, direta e surpreendentemente humana sobre o poder, a política e as distorções da liberdade quando esta é colocada nas mãos erradas.
Mesmo passadas quase oito décadas desde sua publicação, essa obra ainda provoca incômodos, reflexões profundas e, acima de tudo, a dolorosa sensação de que pouco mudou no jogo do poder. É uma leitura rápida — menos de 150 páginas — mas que reverbera na mente e no coração por muito tempo.
A premissa: Quando os oprimidos tomam o poder
A narrativa começa de forma quase inocente: os animais de uma fazenda, explorados há anos por um fazendeiro humano autoritário e negligente, decidem se rebelar. Inspirados pelo discurso de um porco visionário chamado Major, eles se unem, derrubam o opressor e assumem o controle da propriedade. A princípio, o clima é de esperança. Surge uma nova ordem: todos os animais serão iguais, trabalharão por si mesmos e viverão livres da tirania humana.
Mas, como toda revolução que começa com ideais nobres, logo a história toma um rumo sombrio. Os porcos, considerados mais “inteligentes”, passam a liderar os demais. Aos poucos, vão tomando pequenas liberdades. Um litro de leite reservado, um descanso extra, uma decisão feita sem consulta… E assim, quase imperceptivelmente, a nova utopia se transforma em uma ditadura disfarçada, onde “todos são iguais, mas alguns são mais iguais que os outros”.
Uma fábula cruelmente realista
Ao transformar personagens humanos em animais — porcos, cavalos, burros, ovelhas — Orwell não infantiliza a trama. Pelo contrário: ele amplia seu alcance simbólico, tornando sua crítica ainda mais universal. É um recurso que, ao nos afastar da literalidade, nos aproxima do significado profundo da história.
Cada personagem representa algo maior do que si mesmo. E aqui está um dos maiores méritos do livro: sua simplicidade narrativa abriga camadas complexas de crítica social, política e emocional. É impossível não se ver, ou ver nossa sociedade, refletida em cada um dos animais.

Sansão: a inocência traída
Se eu pudesse destacar um personagem que mais me tocou, seria Sansão, o cavalo trabalhador. Forte, leal, incansável. Ele acredita cegamente nos ideais da revolução e, mesmo diante das primeiras injustiças, continua repetindo: “Trabalharei mais” e “Napoleão sempre tem razão”. É impossível não sentir um nó na garganta ao acompanhar sua trajetória.
Sansão representa a massa trabalhadora, aquele povo que carrega nas costas o peso da produção, que mantém o sistema em pé, mas que raramente recebe o reconhecimento ou a liberdade que merece. Ele confia demais. E essa confiança, como tantas vezes na vida real, é cruelmente traída.
Garganta: o poder da manipulação
Outro personagem marcante é Garganta, o porco porta-voz da liderança. Ele é o mestre da propaganda. Sua habilidade de distorcer a realidade com palavras doces e raciocínios capciosos é assustadoramente familiar. Garganta representa os meios de comunicação manipuladores, os discursos políticos que justificam o injustificável, que fazem parecer sensato o que é absurdo.
É através dele que Orwell mostra como a verdade pode ser moldada ao sabor dos interesses do poder. Uma crítica afiada que, convenhamos, se encaixa perfeitamente em nosso tempo, onde a manipulação da informação e as “fake news” moldam a percepção pública com uma facilidade estarrecedora.
Napoleão: o líder que virou tirano
E então temos Napoleão, o porco que assume o controle da fazenda após a morte de Major. De início, ele parece apenas pragmático. Depois, torna-se autoritário. E por fim, transforma-se em um tirano absoluto. A evolução do seu personagem é um retrato impressionante de como o poder corrompe — ou talvez revele — a essência de quem o possui.
Napoleão é a personificação do ditador moderno. Um líder que começou pregando igualdade, mas que logo percebe que o poder absoluto é mais conveniente do que os ideais que um dia defendeu. Orwell deixa claro: a revolução não falhou porque foi mal planejada, mas porque seus líderes deixaram de ser fiéis aos princípios que os inspiraram.
O impacto de ler Orwell hoje

Terminar A Revolução dos Bichos hoje, em pleno 2025, é um soco no estômago. Porque percebemos que os mecanismos descritos por Orwell continuam vivos: promessas políticas que viram opressão, manipulação midiática, perseguição aos que questionam, e uma população que, cansada e descrente, muitas vezes prefere o conforto da submissão à incerteza da mudança.
A sensação que fica é amarga. Mas necessária. Ler Orwell é um convite à vigilância. Um lembrete de que liberdade, justiça e igualdade não são conquistas definitivas, mas batalhas constantes.
Reflexão pessoal: quando as metáforas do livro se tornam realidade
Durante a leitura, confesso que muitas vezes fechei o livro e respirei fundo. Não porque a história fosse complexa, mas porque era demasiadamente próxima da realidade. As semelhanças com regimes atuais, com líderes que surgem como salvadores e se tornam opressores, com populações manipuladas e caladas… tudo isso pulsa nas entrelinhas.
É como se Orwell tivesse escrito um alerta — não para um tempo específico, mas para todos os tempos. Um alerta que ainda estamos aprendendo a ouvir.
Conclusão: Uma fábula, uma advertência, um espelho
“A Revolução dos Bichos” é um daqueles livros que, apesar de curtos, permanecem conosco. Um clássico não apenas por sua qualidade literária, mas porque é eterno em sua mensagem. Orwell nos mostra que os monstros do poder muitas vezes nascem dos sonhos mais puros — e que, sem vigilância, os ideais mais nobres podem ser usados para justificar as maiores injustiças.
Se você procura um livro que provoque reflexão, indignação e uma urgência por mudança, este é o livro. E mais do que isso: é uma leitura essencial para qualquer um que ainda acredita que a literatura pode — e deve — ser uma ferramenta de transformação social.
E você, já leu A Revolução dos Bichos? Qual personagem mais te marcou? Você se identificou com Sansão? Ficou com raiva de Garganta? Sentiu medo de Napoleão?
Deixe seu comentário aqui e vamos continuar essa conversa. Porque, se há algo que Orwell nos ensina, é que refletir é o primeiro passo para resistir. Acompanhe o Blog Meu Refúgio Literário para mais resenhas como essa e compartilhe com quem você acredita que precisa ouvir essa mensagem.
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